sábado, 22 de novembro de 2025

Os Caprinos na Cerveja






Caprino (caprinae) é uma subfamília da família Bovidae que inclui bodes domésticos e cabras, ovelhas, íbexes, entre outros. A criação desse tipo de animal pode ser denominada de caprinocultura, para as cabras, ou ovinocultura, para as ovelhas.

O grupo surgiu no Miocénico, mas só se tornou diversificado durante a última Idade do Gelo, quando muitos dos seus membros ocuparam habitats marginais como tundras, regiões subárticas ou desérticas. Os caprinos têm geralmente uma constituição robusta e são bastante flexíveis na sua alimentação, podendo consumir quase todos os tipos de matéria vegetal. A maioria das espécies da Era Glacial estão extintas, maior parte provavelmente por causa da interação humana.

Os caprinos foram introduzidos no Brasil durante o período de colonização. Devido ao porte, eram facilmente transportados nos navios. Da mesma forma, devido à grande adaptabilidade a muitos ambientes, podiam ser criados nos territórios recém-colonizados, sem maiores problemas para subsistência.
Como as vacas, cabras são ruminantes, o que significa que eles têm um sistema complexo de estômagos para a digestão. Cabras pastam usando seus lábios, dentes e língua. Em seguida, leva 11 a 15 horas para que o alimento passe através de quatro estômagos.

E o bode, por que ele gosta de aparecer nos rótulos de cerveja? Bock em dialeto bávaro alemão significa bode, um animal que simboliza a força e é bastante usado na maioria dos rótulos desse tipo de cerveja, então, o simpático caprino acabou sendo incorporado como mascote oficial.

Existe uma conexão interessante e divertida entre o signo de Capricórnio e a cerveja do estilo Bock.

O nome desse estilo de cerveja pode estar relacionado aos monges medievais da Alemanha, que produziam uma cerveja forte e nutritiva durante seus períodos de jejum. A produção ocorria, supostamente nos meses de dezembro e janeiro, durante o período do signo de Capricórnio, que tem como símbolo a cabra ("Bock" significa "bode" ou "cabra" em alemão). Devido a essa associação, algumas cervejarias no Brasil e no mundo já criaram rótulos específicos chamados "Capricórnio" no estilo Bock.


Não há jejum que não dê em fartura. Há cerca de 700 anos, os monges da cidade de Einbeck produziram um estilo de cerveja maltado, de cor escura e com um alto teor alcoólico. Esta inovação tinha um objetivo muito claro: ajudá-los a manter a energia durante as longas horas de jejum da quaresma.

Einbeck é uma cidade ao norte da Alemanha que não teria nenhuma razão para brilhar, se não fosse pelo fato de ser o berço do estilo de cerveja mais emblemático do inverno – o Bock. Esse estilo de cerveja é um dos preferidos para o inverno e esse casamento com o frio não é por acaso. Afinal, estamos falando de bebidas mais maltadas e com alto teor alcoólico, e a maioria dos fabricantes desse estilo usam a imagem de um bode em suas embalagens.

Tudo começou no séc. XIII na cidade alemã de Einbeck. Por lá se fabricava uma cerveja encorpada, mais alcoólica, levemente adocicada e que atraía muito os mercadores da região.

A cerveja, que passou a ser conhecida como Bock, um regionalismo bávaro do sufixo “Beck”, proveniente do nome da cidade de Einbeck, rapidamente ganhou novas versões, até para responder a um certo descontentamento de alguns monges pela “leveza” da sua criação original. Foi assim, por exemplo, que nasceu a Doppelbock (literalmente, Bock a dobrar). Reza a história que o sucesso das Bock junto da população foi tal que os clérigos começaram a pôr em causa a sua própria invenção: será que tinham criado um produto tão bom que, ironicamente, era contrário ao espírito de arrependimento da Quaresma?

Com a dúvida na cabeça, foram até Roma, com um barril da sua cerveja, para obter aprovação papal. Durante a longa viagem, porém, a cerveja estragou-se. Quando o Papa a experimentou, o sabor era tão ruim que, de imediato, o pontífice a considerou uma excelente penitência. Assunto resolvido.

Por volta de 1500, o Duque Wilhelm V da Bavária decidiu que começaria a fabricar sua própria cerveja, usando como inspiração a Ale de Einbeck. O objetivo do Duque era recuperar o mercado que a região havia perdido para os comerciantes do norte.

Essa situação perdurou até o começo do séc. XVII, mais precisamente 1617, quando anos depois, o sucessor do Duque, Maximilian, contratou um mestre cervejeiro de Einbeck, Elias Pichler, para reproduzir aquela cerveja.

Enquanto isso, Einbeck parou de produzir o estilo pois a cidade sofreu duas calamidades que arruinaram sua economia: Dois grandes incêndios e, logo depois, a Guerra dos 30 anos (1618-1648), guerra tal que prejudicou não só a cidade, mas boa parte da Alemanha.

Enfim nasceu a versão de Munique, que não era igual à de Einbeck. Era mais escura e usava 100% cevada, diferente da original, que usava 1/3 trigo + 2/3 cevada. Além disso, devido ao lúpulo ser mais caro em Munique e a água usada (do rio Isar) mais alcalina, o que aumentaria o amargor áspero e ruim, a nova versão teve seu teor de lupulagem reduzido na receita.

Essa adaptação caiu no gosto popular e, finalmente, ganhou o público.

Quando a Bock de Munique ficou pronta, ela levou o nome de Ainpöeckish Pier em homenagem a Einbeck. Não demorou muito para que os consumidores passassem a chama-la simplesmente de Ainpöeckish, depois Poeck e, finalmente, ganhou o nome de bock, isso porque na Baviera, einbeck se pronunciava einbock. Foi assim que então passou-se a pedir a cerveja “ein bock”, ou “uma bock”.

Comecemos a mostrar alguns exemplos de rótulos de cerveja:
Os cabritos, por serem mais novos, vem em primeiro lugar, dois rótulos: um gaúcho, um mineiro e uma propaganda de jornal Paranaense.
  

Como não consegui nenhuma imagem nem texto que faça referência à cabra, passemos aos bodes:
 

  

  

  

Agora uma curiosidade: A Fábrica de Cerveja Cabrito, era no Paraná, instalada em São José dos Pinhais, competia com os fabricantes de cerveja de Curitiba. Durou um certo tempo pois em 1910 já existia e manteve propaganda no jornal Diário da Tarde durante os anos de 1915 e 1916.
Foto do acervo de Maria Angélica Marochi que mostra funcionários e familiares do proprietário, Frederico Puglia, posando para esta histórica foto da Cervejaria Cabrito em 1910. (adaptado do texto original de Paulo Grani)

quarta-feira, 12 de novembro de 2025

Os Bovinos na Cerveja






Os bovídeos constituem uma família de mamíferos ruminantes, cuja principais características são os cascos fendidos e chifres não galhados, à qual pertencem os animais domésticos como bois, ovelhas e cabras e os animais selvagens, como os bisões e os antílopes.

O adjetivo bovídeo refere-se a esta família e não é sinônimo de bovino. Um bovídeo pode ser um bovino, no caso do boi (gênero bos) e do búfalo (gênero bison) apesar de serem de gêneros diferentes, ou não ser um bovino no caso da ovelha (gênero ovis) ou cabra (gênero capra).

Os bovinos se dividem em tres grandes grupos: os taurinos (Bos taurus), os zebuínos (Bos indicus) e o bisões (bison), cada um com características próprias que influenciam diretamente na sua adaptação, produtividade e manejo. Essas diferenças surgiram ao longo de milhares de anos de evolução.

Atualmente há muitas logomarcas de animais em rótulos de garrafas ou latas de cerveja, usando muita criatividade e belos desenhos, mas a verdadeira obra de arte são as logomarcas antigas.

A relação entre os bovinos e a cerveja é uma forma de ação climática em que todos saem ganhando: nós bebemos a cerveja e os bovinos comem os resíduos da produção de cerveja, apesar de que os bovinos impactam o clima através das emissões de gases de efeito estufa, como o metano, liberado na digestão, e o óxido nitroso, proveniente dos excrementos. mas mitigamos as alterações climáticas com a modernização do sistema produtivo, com a reforma de pastagens degradadas e a integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF), compensando as emissões dos bovinos, mas vamos falar sobre a relação entre eles de outra forma, as logomarcas de bovinos na cerveja.

Muitos autores afirmam ser o ano de 1899 como a data de criação da cerveja Caracu, junto com a criação da Fábrica de cerveja e Gelo do Major carlos Pinho, em Rio Claro - SP.

Esta é uma afirmação pouco provável pois tanto na relação dos produtos dessa cervejaria quanto na dos seus sucessores até 1920 não há nenhuma referência à essa marca de cerveja. Em 1921, Quando já pertencia a Oscar Baptista da Costa é que aparece pela primeira vez a cerveja Caracu no registro da Junta comercial do Estado de São Paulo, JUCESP. A partir daí passa a aparecer nos jornais e documentos.

Mas, sendo verdadeiro ou não, há mais de 100 anos vemos na mídia, a imagem de um animal reconhecido pela força e vitalidade, um touro da raça Caracu, raça desenvolvida no Brasil, de animais trazidos de Cabo Verde em 1534, por Martim Afonso de Souza. Para ilustrar este texto colocamos, abaixo, alguns rótulos da cerveja Caracu.

  

    


Em 10 de julho de 1917, foi publicado no Diário oficial de São Paulo o registro da cerveja Zebu pela Companhia Cervejaria paulista de Ribeirão Preto.


Em 2011 a Cervejaria Guitt’s lança a cerveja Zebu Stout, afirmando virilidade, força e autenticidade definem a origem da marca.


Por volta de 1922, a Cervejaria gazapina, de Santana do livramento, produz as cervejas escuras Touro e Vacca, assim mesmo com duas letras “C”.
  


Temos também exemplo de bisão americano, como no caso da cerveja Cumbica da cervejaria Pressanto


Com o boom das cervejas artesanais sendo produzidas, em larga escala, em latas e garrafas começaram a aparecer marcas com animais estilizados ou somente com texto sem imagem, como por exemplo a cerveja caseira Natural Zebu que no proprio rótulo diz que destina-se ao consumo do produtor e de seus familiares.


Ou como as cervejas Touro Sentado que faz referência a um chefe índio americano, da Cervejaria Dogma:
    


E para fechar este texto que não exaure a quantidade de bovinos na cerveja, a manada é grande, mostramos uma vaca verde da Cervejaria Seasons e uma silhueta da Cervejaria Stier.
  


segunda-feira, 10 de novembro de 2025

O Elefante na Cerveja


Texto desavergonhadamente copiado de Significados nas representações escultóricas da fachada da Cervejaria Bopp & Irmãos, Porto Alegre.


Está vendo um elefante cor de rosa? Em Melle na Bélgica, em 1988, nasceu o rótulo mais famoso da cervejaria Brouwerij Huyghe: a Delirium Tremens. Seu nome faz referência a um sintoma clássico da abstinência alcoólica severa, mas seu sabor e qualidade fizeram o mundo associá-la a outra coisa – uma das melhores cervejas belgas já criadas.
Rapidamente, a cerveja se tornou um fenômeno global, sendo reconhecida pelo seu sabor complexo, sua garrafa de cerâmica e, claro, pelo elefante rosa, que virou um ícone do mundo cervejeiro.

O símbolo logomarca “Elefante”, na maioria dos países, é primeiramente associado à força e alguns casos ao tamanho, sendo muito comum ser usado em cervejas principalmente pretas ou especiais.

Atualmente a maioria dos países principalmente os asiáticos tem alguma cerveja, basicamente em lata, com a marca ou o símbolo de um elefante.

No Brasil, a marca foi utilizada pela Cervejaria Bopp desde o seu início com O fundador e mantida por seus filhos até que com a fusão em 1924 passou a pertencer à Bopp, Sassen, Ritter (Cervejaria Continental) e em 1946 passou a pertencer à Brahma que abandonou o registro da marca. (A Brahma produziu uma cerveja com o rótulo “Elefante” mas que foi retirada do mercado porque o registro da marca já pertencia à Serramalte)

    


Por volta de 1914 a Cervejaria pernambucana passa a usar o elefante como seu símbolo e aparece em todos os rótulos de suas cervejas até a falência em 1926 e compra pela Antárctica que leva a marca Elefante.

    

No caso da Serramalte, a cerveja "Elefante" foi lançada em 1972, durante a celebração dos 15 anos da empresa, era uma das cervejas escuras da Serramalte, ao lado de Biruta e Malzebier, como parte do portfólio de cervejas escuras. Com a compra da Serramalte pela Antarctica em 1980, o elefante saiu de circulação, já que a fábrica durante duas décadas passou a fabricar somente a cerveja Antarctica, abandonando as marcas originais da Serramalte.


Elefante foi a primeira marca de cerveja (preta) fabricada pela família Bopp (Carlos Bopp e esposa).

Como tantas histórias de sucesso, a carreira cervejeira de Carlos Bopp começou quase ao acaso, nas últimas décadas do século XIX. Filho de imigrantes alemães, o funileiro casou-se com Maria Luiza Haertel, filha de um cervejeiro de Pelotas, e instalou uma fábrica de vidros e latarias na então Rua do Comércio, hoje Uruguai, no Centro de Porto Alegre. Um dos clientes de Bopp encomendou uma pequena caldeira, no ano de 1881, mas nunca voltou para buscá-la, a esposa de Carlos sugeriu que se utilizasse a caldeira para fazer cerveja e, desta forma, abrandar o prejuízo. Assim, a mulher fazia a cerveja e Carlos, nos finais de semana, colocava os recipientes num carrinho de mão e vendia o produto na vizinhança. O sucesso foi tão grande que a produção cresceu e surgiu a fábrica.

Com a expansão dos negócios, em 23 de dezembro de 1886, a Cervejaria Bopp se transferiu para o terreno da Rua da Floresta nº 11, atual Rua Cristóvão Colombo, próximo a Cervejaria Becker.

Carlos Bopp gostava de dizer que quem tomava cerveja ficava forte como um elefante. Por isto, o grande animal passou a ser uma espécie de símbolo da família. Passou a ser a marca de sua cerveja, registrada em 1905, e até o prédio tinha uma pequena imagem de elefante no telhado.
  


Em 1907, a cervejaria já era uma das mais importantes do país (O Independente, p.1, 29 nov. 1911) e, em 1909, dois anos depois, os três filhos do funileiro (Carlos, Arthur e Alberto) deram início à Bopp & Irmãos, continuaram a usar o símbolo da família, o elefante e mais tarde, por volta de 1910/11 foi construído um novo prédio que foi inaugurado em 27 de outubro de 1911.



O prédio da Cervejaria Bopp & Irmãos foi considerado, na época, como o mais vasto prédio de cimento armado existente no país (IORIS et al., 1999, p. 10)5. Foi construído pelo escritório de engenharia de Rudolph Ahrons, um descendente de imigrantes alemães que estudou na Politécnica de Berlim, onde se formou em 1902. Ahrons foi catedrático da Escola de Engenharia de Porto Alegre, da qual foi fundador, e presidente da Companhia de Seguros Aliança do Sul, da qual era sócio. Foi, enfim, uma pessoa com trânsito nos círculos de poder e de grande influência social. O projeto arquitetônico e iconográfico é de Theodor Wiederspahn, um imigrante alemão que estudou na escola de construção de Wiesbaden, de onde saiu em 1894. Responsável pelos projetos dos mais importantes edifícios de Porto Alegre dessa época, Theo Wierderspahn chegou ao Rio Grande do Sul para trabalhar na construção de estradas de ferro (DOBERSTEIN, 1992). As esculturas da fachada foram executadas pelos escultores de João Vicente Friederichs, também descendente de alemães. Um desses escultores, Ernesto Schob, foi contratado em Munique6. Com relação ao grupo social que encomendou essa fachada, é preciso assinalar ainda que os Irmãos Bopp eram, também, descendentes de imigrantes alemães, que integravam a emergente burguesia industrial porto-alegrense. Suas esculturas são irônicas e brincalhonas: um Mercúrio escorado a uma luminária, aparentemente inebriado pelos efeitos do álcool; um elefante, o símbolo da família Bopp, em posição de coroa do prédio (onde se elevaria, por exemplo, numa igreja, uma Santa Maria; ou uma águia, num palácio real), garrafas empilhadas formando colunas na porta principal subvertem o academicismo, divertem e chamam a atenção do público.



O conjunto escultórico central, localizado na fachada do prédio aqui denominado 1(um)9 e que está mais visível ao público (situa-se no limite da calçada), é encimado pela figura de um elefante, localizado centralmente, sobre o frontão e a data do prédio, e ladeado por duas pilastras, sobre as quais estão duas estruturas globulares circundadas por crianças. Mais abaixo, na continuidade das pilastras, existem duas efígies coroadas e emolduradas por guirlandas de frutas, lúpulo e espigas de cereais; recorrentes nos dois prédios que originalmente constituíram a fábrica; e, num nível um pouco mais baixo, um gato (à esquerda) e um cão (à direita) sobressaem da parede do prédio. Neste nível está a platibanda do edifício, onde, sobre o limite da fachada frontal esquerda, ergue-se, sobre um pedestal, em cuja base foi colocada uma coruja, a figura de Mercúrio, acompanhada por um galo e um bode. Trata-se de um Mercúrio em atitude displicente, com um leve sorriso, quase debochado, apoiado sobre uma luminária. Abaixo, na altura do cão e do gato, na quina do prédio, há duas efígies que, como as descritas anteriormente, estão coroadas por guirlandas de lúpulo e espigas de cereais. Porém estas, de maneira diversa daquelas, têm um aspecto mais grotesco, com olhos e lábios inchados.

O motivo mais relevante e original da fachada é, sem dúvida, o Elefante e, em seguida, Mercúrio. É importante destacar que Elefante e Mercúrio se tornaram as duas das principais marcas de cerveja produzidas pela fábrica. Porém, a representação de Mercúrio na fachada é anterior à marca da cerveja, ao contrário da cerveja Elefante, que já existia anteriormente. Além disso, o fato de as cervejas se denominarem Elefante e Mercúrio não é o bastante para que se conheça o que eles significavam e a sua importância no conjunto geral das representações escultóricas da cervejaria: no entanto, elas chamavam-se Elefante e Mercúrio, e não outro nome qualquer. Mercúrio é uma das figuras mais complexas da mitologia, convergindo para ele várias tradições: babilônica, egípcia, grega, romana. Mercúrio tem sido considerado como o símbolo da inteligência industrial e do comércio. Provavelmente o Mercúrio foi escolhido pelo mesmo motivo que na Tietz: porque simboliza o potencial comercial da empresa. O Globo expressa este mesmo imaginário: o comércio se estende pelo mundo inteiro. Porém, e para além disto, Mercúrio possui a força de elevação e a amplitude de deslocamentos rápidos: mensageiro por excelência, ele representa a mediação entre o céu e a terra, a viagem entre os mundos. Ele representa o elemento ar e simboliza a eloquência e a sabedoria. Mas é, também, o protetor dos ladrões, representando as formas de perversão intelectual que se encontram em todos os tipos de trapaça, habilidades maliciosas, astúcias e espertezas. Entre os atributos que acompanham o Mercúrio, é a sacolinha de dinheiro que exprime o comércio. Este atributo, se não está ausente no Mercúrio da Bopp, ao menos não é visível facilmente, o que, enfim, resulta no mesmo. Mas, com certeza, ele tem outros atributos bem visíveis: o caduceu, o chapéu alado, o galo e o bode. Estes atributos nada têm a ver com o comércio. Com seu caduceu, Mercúrio faz as pessoas dormirem ou acordarem. O bode é uma representação recorrente em todo o prédio. Simboliza a força vital da libido e a fecundidade. É um animal ritualmente consagrado a Dionísio e servia de montaria à Afrodite. O bode tem, talvez, ligação com o tipo de cerveja chamada Bock (bode). O galo é psicopompo, ser que acompanha os mortos, já que suas almas devem renascer à luz de outro mundo. Assim, ele está associado a Mercúrio, porque essa divindade é o mensageiro que percorre os três níveis do cosmo: inferno, terra e céu. O galo, junto com o cachorro (que aparece um pouco mais abaixo) e o cavalo, fazia parte dos animais psicopompos que eram sacrificados aos mortos nos rituais funerários dos antigos germanos (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1982, p. 282). Como aquele que anuncia o dia que sucede à noite, o galo está sobre os campanários das Igrejas e das torres das catedrais (Ib.). Associado à serpente, como em Mercúrio, o galo marca a integração das forças telúricas, onde espírito e matéria tendem a equilibrar-se numa unidade harmoniosa (Ib.). O galo corresponde, ainda, ao Mercúrio alquímico.

O Mercúrio displicente e debochado da fachada da cervejaria Bopp está muito mais próximo das viagens, das habilidades maliciosas e da busca de harmonia entre espírito e matéria, que da inteligência industrial e comercial, ainda que uma não exclua a outra.

A coruja, por sua vez, é o pássaro de Atena, símbolo do poder racional, mas também um atributo dos adivinhos: ela simboliza os dons de clarividência. Ela não faz parte da iconologia do Mercúrio. Talvez tenha sido associada a ele por ser também uma divindade de inteligência e sabedoria. E a explicação pode estar no fato, como Hauser alertou em seu depoimento, de que a embriaguez é um estado semelhante ao êxtase, em que profetas, sacerdotes etc. proferem sabedorias divinas. Este argumento é reforçado pela representação, colocada logo abaixo de Mercúrio, de cabeças com lábios inchados, com um aspecto de quem já bebeu bastante, coroadas por espigas de cevada e lúpulo. Entre as duas cabeças, surgem talheres que, associados às demais figuras, lembram festins e fartura.

As efígies, especialmente as que estão logo abaixo de Mercúrio, mesmo consideradas as diferenças existentes nas suas representações neste conjunto, por seus atributos, remetem imediatamente a Dionísio. Deus da vegetação, da vinha, do vinho e da embriaguez (é fácil estabelecer uma ligação direta com a cerveja: ao invés de uma coroa de vinhas, temos a de cevada e lúpulo), das frutas e das estações renovadas, Dionísio é considerado como o símbolo do esforço humano de espiritualização. O culto a Dionísio testemunha o esforço da humanidade em romper a barreira que a separa do divino. Através dele, os homens se introduzem no mundo dos deuses e transformam-se em uma raça divina. Ele representa a ruptura das inibições, das repressões, das repetições. É o deus que preside os ímpetos que provocam a liberdade, em todas as suas formas, criador de ilusões e milagres. O transbordamento de sensualidade e a liberação do irracional seriam formas desajeitadas dos homens de procurar algo de sobre-humano (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1982, p. 357, 358).

Com relação ao elefante, duas questões se impõem: por que o nome Elefante foi escolhido como marca e por que este animal-marca foi colocado como figura principal do prédio e não qualquer outra figura alegórica que simbolizasse a cerveja.

Sabemos que este é um animal que movimenta a fantasia das pessoas ao combinar o tamanho colossal e o exotismo. Com o desenvolvimento do saber científico, todos que desejassem tematizar um animal tinham, a partir do século XIX, ao lado dos velhos manuais iconológicos, as enciclopédias científicas. Em uma delas – publicada em Stuttgart por Julius Hoffmann, em 1875 (Heinrich Rebau's Naturgeschichte für Schule und Haus: eine gemeinfassliche und ausführliche Beschreibung aller drei Reiche der Natur) –, segundo Hauser, consta que o elefante adora beber vinho e aguardente de arroz, e que ele ingere enormes quantidades de água, chegando a 30 baldes por dia no verão. É provável que esta característica tenha pesado na hora da escolha do símbolo.

Em geral, na literatura ocidental, o elefante simboliza a força, a resistência, a prosperidade, a longevidade, a sabedoria e a boa memória. Muitas vezes tais qualidades eram atribuídas ao imperador, já que era o animal dos imperadores (Hauser, 2003) (lembremos o impacto causado no Império Romano, quando Aníbal realiza uma impressionante demonstração de força com os elefantes de seu exército). Essas associações positivas certamente influenciaram a escolha do elefante como símbolo não só da cerveja, como também da fábrica e, mais, da família Bopp.